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SANTO ÂNGELO
08 de julho de 2025
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Opinião

Quando viver era sentir

  • maio 12, 2025
  • 3 min read

Tive que aprender a viver sozinho aos 13 anos. Era só um menino, rico de coragem e com a mochila cheia de sonhos, desembarcando em Santa Maria com o coração apertado e o olhar curioso. O ano era 2007. Eu não tinha celular com internet. O meu era de abrir e fechar, só para dizer “alô”. Tinha carta. Tinha saudade. E tinha o tempo — inteiro, cru, sem distrações — à minha disposição.

Os dias eram corridos e cheios. Cheios de sensações e de vida. As manhãs tinham cheiro de livros antigos da biblioteca, e as tardes, o som dos sinos da catedral. Eu fazia amigos olhando nos olhos e paquerava com bilhetes, bochechas vermelhas e mãos suadas. Não havia “curtir”, havia coragem. A coragem de puxar conversa no recreio, de esperar do lado de fora da aula só para caminhar junto até o ponto de ônibus do colégio. Tinha o medo gostoso da rejeição e o calor do afeto quando dava certo.

Foi assim que aprendi o valor do toque, do tempo compartilhado, da escuta. Cada gesto era um código; cada encontro, uma construção. Amar era artesanal. E viver… uma experiência tátil, sonora, inteira.

Hoje, me pergunto o que fizemos com essa beleza toda. Estamos mais conectados do que nunca — e mais ausentes do que jamais estivemos. Gritamos em silêncio pelas telas, enquanto esquecemos a maciez de uma conversa ao pé do ouvido e o cheiro enigmático do perfume dos amados. Reagimos com emojis, mas trememos diante de um abraço. Confundimos presença com notificação.

Se aos 13 eu tivesse tido WhatsApp, talvez não tivesse aprendido a esperar. Nem escutado o som da minha solidão — que me ensinou quase tudo sobre gente, até estudar neurologia. Talvez tivesse perdido a chance de me apaixonar por alguém só pelo jeito que sorria para os outros.Viver, naquele tempo, era com os cinco sentidos. Hoje, parece que queremos viver com um só dedo — o polegar. E com medo de deslizar na direção errada.

Construir um amor saudável não é seguir regras do Instagram. É errar e acertar junto. É conversar até dormir. É entender que o outro também é um universo em construção — e que vale a pena ficar.

Sinto saudade da vida quando ela era mais presença do que promessa. Quando se dizia “eu gosto de ti” com a boca — e não com um áudio acelerado.

O mundo mudou. Mas talvez a gente ainda possa voltar. Não no tempo — isso é impossível. Mas na forma. Na escolha de sentir. De viver de verdade. Porque a tecnologia pode encurtar distâncias, mas só o afeto aproxima corações.

E eu, que fui menino sozinho numa cidade grande, sei bem: viver e amar se faz com o corpo todo. Caso contrário, teremos um amor descartável. Que qualquer vento de outono, em um maio também qualquer, leva e acaba. Roguemos por relações que perdurem felizes, amém. Um abraço do Dr. Norberto.

 

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NORBERTO WEBER WERLE

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