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SANTO ÂNGELO
15 de agosto de 2025
Rádio AO VIVO
Opinião

A estética da política

  • maio 16, 2025
  • 2 min read

As comissões parlamentares de inquérito (CPIs), conforme o art. 58, §3º, da Constituição Federal, possuem poderes de investigação próprios das autoridades judiciais.

Esta reflexão, no entanto, não se propõe a discutir os aspectos constitucionais, matérias ou limites das CPIs, mas sim recordar que investigação é algo sério — e deveria ser tratada como tal pelo Parlamento.

O que se observou, porém, na atuação do senador Cleitinho, que tietou uma (des)influencer durante uma sessão da CPI das Apostas, revela muito sobre os novos tempos da estética política brasileira.

Se outrora a política era permeada por argumentos, retórica e estratégia, hoje se configura como um espetáculo no qual personagens encenam performances cuidadosamente ensaidas.

Não por acaso, Jacques Rancière, filósofo francês, fala em “regimes estéticos” não apenas no âmbito da arte, mas também da política — dois campos que compartilham, mais do que se imagina, uma gramática visual e sensível.

Na arte, o regime estético marca uma ruptura com a ideia de que ela deva servir a propósitos morais ou utilitários. A estética, nesse contexto, não é mero adorno, mas uma forma de organizar o sensível — de decidir o que pode ser visto, dito e sentido.

É aí que a política entra: ela também define visibilidades. Ao escolher quais corpos devem aparecer, quais vozes devem ser ouvidas, a política aparece como uma prática estética.

Estamos diante de um abismo: de um lado, o conteúdo; de outro, a imagem como partilha do sensível. Se a arte pode sobreviver à sua autonomia estética, a política, normalizada como espetáculo desprovido de ética, afasta-se dos compromissos sociais que a sustentam.

É urgente recuperar uma estética da política que vá além da encenação — uma política que, como a boa arte, seja capaz de romper com o sensível estabelecido, abrir espaço ao dissenso e fomentar construções verdadeiramente democráticas.

Desse modo, poderemos reimaginar o comum, não como um palco de máscaras, mas como um território vivo de discussão, voltado à satisfação das necessidades do povo em uma sociedade estruturalmente desigual.

 

 

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Andrey Régis de Melo

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