A ilusão do populismo penal
Em momentos de maior violência, ganha força no país um fenômeno recorrente: o populismo penal, estratégia pela qual políticos respondem ao medo social com promessas de leis mais duras, novos crimes e discursos de “tolerância zero”.
São as chamadas leis simbólicas, redigidas sem a mínima discussão especializada e feitas para produzir manchetes e dividendos políticos — não resultados. Trata-se de uma receita adotada por governantes desde a década de 1990.
Nos últimos anos, os palanques eleitorais passaram a ser ocupados quase exclusivamente por essa retórica punitivista, que oferece respostas simples para problemas complexos.
Enquanto isso, temas estruturais — como educação, distribuição de renda e políticas públicas de longo prazo — vão sendo empurrados para segundo plano, como se a segurança pública se resolvesse apenas com mais cadeia.
Esse movimento reaparece no debate sobre o projeto antifacção, hoje em tramitação no Congresso Nacional. O texto promete enfrentar organizações criminosas com endurecimento penal, ampliação do isolamento carcerário e novos instrumentos processuais.
Todavia, repete a fórmula de sempre: aposta quase total na repressão, ignorando que as facções se fortaleceram justamente dentro de um sistema prisional superlotado e na anomia social presente em territórios pauperizados.
Endurecer penas sem reformar esse sistema é apenas reforçar o ambiente onde essas organizações nasceram. Some-se a isso o risco de flexibilização de garantias processuais em nome da “eficiência”, abrindo espaço para julgamentos apressados e seletivos — que atingem, como sempre, os mais vulneráveis.
Combater facções exige muito mais: inteligência policial integrada, investigação financeira, cooperação federativa, presença estatal em áreas vulneráveis e investimento no sistema prisional.
Mais punição, isoladamente, não desarticula redes criminosas sofisticadas — exceto se o objetivo for prender os mesmos de sempre, sem alcançar os barões do crime.
O populismo penal prospera porque o medo reclama urgência. Mas segurança pública não pode ser tratada como slogan eleitoral. Enquanto insistirmos no endurecimento retórico e abandonarmos políticas estruturais, continuaremos presos ao mesmo ciclo: leis penais duras, consequências impremeditadas e criminalidade elevada.

