
O tenente-coronel do Exército Hélio Ferreira Lima afirmou, em depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira (28), que o plano que previa a “neutralização” do ministro Alexandre de Moraes e a prisão de membros do Supremo não passava de um exercício interno de simulação da inteligência militar, desenvolvido no Rio Grande do Sul. A informação é do jornal O Globo.
Segundo o oficial, o plano era um cenário “hipotético” de inteligência, elaborado durante o período eleitoral de 2022, com o objetivo de monitorar possíveis manifestações bolsonaristas próximas aos quartéis. Ele declarou que recebeu a orientação de produzir estudos prospectivos caso surgissem indícios de fraude eleitoral.
— Se amanhã sair um relatório ou um pronunciamento falando ‘atenção, teve fraude sim’, eu não posso deixar meu comandante ser surpreendido. Eu tenho que ter alguma coisa para que a gente comece a discutir com o Estado-Maior — declarou Hélio durante o interrogatório.
O militar integra o núcleo 3 da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre a tentativa de golpe de Estado articulada no fim do governo Jair Bolsonaro. Durante as investigações, a Polícia Federal encontrou um pen drive com o documento intitulado “Desenho Op Luneta”, que detalha, em cinco etapas, um plano para a tomada de poder. A defesa alega que o material é apenas um estudo de cenário prospectivo.
O oficial também declarou que, mesmo que o plano fosse colocado em prática, as forças especiais do Exército não teriam estrutura suficiente para executar uma ruptura institucional:
— Ainda que todas as forças especiais tivessem que se juntar para fazer um golpe, a gente seria fagocitado até por uma polícia de qualquer Estado que tem um efetivo muito maior — afirmou.
Etapas do plano
A PGR detalha que a primeira etapa do documento apresentava uma análise da “instabilidade” no Supremo Tribunal Federal. A chamada “tendência natural”, terceira fase do plano, previa o aumento do controle estatal sobre os elementos considerados desestabilizadores, até que se atingisse o “Estado Final Desejado” (EFD) com o controle total dos Três Poderes pelo grupo. A última etapa indicava a necessidade de eliminar os focos de “ilegalidade e instabilidade” para retomar a “normalidade institucional”.
Reuniões e outras acusações
Hélio Ferreira Lima também é acusado de participar de reuniões com o então ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, e com o tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira. Um dos encontros ocorreu na casa do general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa. Segundo a acusação, o objetivo era debater ações clandestinas contra Alexandre de Moraes.
Em depoimento, o tenente-coronel negou ter discutido qualquer plano com Braga Netto e classificou o encontro como uma conversa breve, a pedido de Mauro Cid.
Sobre a acusação de que teria monitorado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante o período de transição, Hélio afirmou que estava em Brasília apenas para visitar o filho, embora sua residência seja em Porto Alegre.
A denúncia também cita trocas de mensagens com Mauro Cid em que discutem possíveis pretextos para contestar o resultado das eleições, inclusive com o uso de hackers. O militar confirmou ter enviado documentos ao ex-ajudante de ordens, alegando que havia suspeitas sobre a integridade do processo eleitoral de 2022.
“Kids Pretos” e núcleo militar
Outro militar ouvido nesta segunda-feira foi o tenente-coronel Fabrício Moreira de Bastos, que também integra o núcleo militar do suposto golpe. Ele é apontado pela PGR como um dos responsáveis por articular a reunião do grupo conhecido como “Kids Pretos”, formado por integrantes das forças especiais.
Segundo a acusação, o objetivo do encontro era pressionar o então comandante do Exército, general Freire Gomes, a aderir ao plano de ruptura. Moreira de Bastos negou a intenção golpista e afirmou que se tratava apenas de um encontro informal entre colegas.
Com os depoimentos desta segunda, o Supremo Tribunal Federal conclui a fase de interrogatórios dos réus envolvidos na tentativa de golpe.