Golpe e democracia
O Brasil caminha para um momento decisivo de sua história democrática. O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de militares de alta patente, acusados de conspirar contra a ordem constitucional para subverter o resultado das eleições de 2022, escancara um dilema nacional: como lidar com os fantasmas do autoritarismo sem ferir as bases do Estado de Direito?
Os elementos investigativos coletados pela Polícia Federal viabilizaram a instauração de uma ação penal para apurar a prática de crimes contra a democracia.
O cenário descoberto — que antes parecia um delírio autoritário — ganhou contornos de plano articulado, com estrutura, participantes e objetivos claros: impedir a posse de Lula e manter Bolsonaro no poder, à margem da legalidade.
O cerne do julgamento é, portanto, político e jurídico. Político, porque envolve uma figura ainda influente na extrema-direita brasileira, com base eleitoral e mobilização ativa. Jurídico, porque está em jogo a responsabilização por atos que ferem a Constituição, a soberania do voto e o princípio republicano.
O STF decidirá se as provas configuram tentativa de golpe e se os acusados, após a individualização das condutas, devem ser punidos na esfera penal.
Com o término dos interrogatórios, o processo ruma para a fase final. O prognóstico aponta para condenações — talvez algumas absolvições. Bolsonaro pode ser inabilitado por um período prolongado e, os militares, caso confirmada a participação direta, devem ser sancionados.
A expectativa, entre juristas, é de sentenças duras, como forma de reafirmar os limites da democracia brasileira. Mas o processo será também uma prova de maturidade institucional. Julgar um ex-presidente e generais exige serenidade, provas e respeito ao devido processo legal, assegurando-se aos réus o contraditório e a ampla defesa.
Mais que um acerto de contas, este julgamento é um marco civilizatório. Não se trata apenas de punir, mas de dizer ao país — e ao mundo — que tentativas de ruptura não terão amparo, ainda que travestidas de patriotismo.
A democracia brasileira, sob os auspícios da Constituição de 1988, precisa mostrar que sabe se defender — e que ninguém está acima da lei.